Você cita uma pesquisa que mostra que os ricos não se consideram ricos. Sempre tem um patamar acima para ser comparado, explorado e alcançado. Tem a questão da vida da Catarina, que é descrita como “simples, com conforto” ao custo de R$ 156 mil por mês. Por que existe essa falta de consciência de classe?
Existe porque vem daquela fragilidade que estava tentando te dizer. O aspecto importante da Catarina é que ela consegue, olhando para a própria vida, olhando para a realidade brasileira também, perceber que não vive uma vida normal, uma vida média, uma vida cotidiana num país tão desigual quanto o Brasil.
E isso é interessante porque essa ideia desmistifica um pouco o senso comum de achar que os ricos são completamente alienados diante da situação e do caos brasileiro, o que não é uma verdade. Eles sabem que vivem uma vida privilegiada.
Agora, qual é a grande questão? Como a gente tem essa posição que está muito balizada no reconhecimento do outro, você nunca se sente suficientemente seguro para poder chancelar, validar claramente ou defender a sua posição. Você precisa do olhar do outro neste jogo.
O segundo ponto importante é que se esse objeto de luxo, essa coisa de rico, for forte o suficiente e ela funcionar, ela, em geral, vai me catapultar para o mundo dos ricos. E quando ela me catapulta para o mundo dos ricos, ela me faz automaticamente mais pobre do lugar onde estou.
Por exemplo, quase todo mundo já viveu isso. Quando você vai fazer sua primeira viagem internacional, você acha que ir para Paris é rico para caramba. Mas aí, na hora que você entra dentro do avião e vê a classe executiva, e você está na poltrona mais barata da econômica, perto do banheiro, você fala: ‘caramba, sou pobre’. Antes de você ir, achava que ir a Paris era coisa de rico. Mas quando você entra no avião, já descobre que é o pobre do avião.
Para quem ficou do lado de fora, seus parentes que nunca viajaram, você é visto como rico. Só que no mundo que você conseguiu entrar, que é a partir da coisa de rico que é a viagem, você automaticamente vira o pobre.
