Cientistas identificam novo anticorpo com potencial para prevenir e tratar o HIV

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Cientistas identificam novo anticorpo com potencial para prevenir e tratar o HIV
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Pesquisa HIV: embora resultados sejam animadores, testes se restringiram a modelos animais, exigindo testes em humanos (Ilustração: Jonatan Sarmento/VEJA)

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Imagine se um único anticorpo pudesse neutralizar praticamente todas as variantes conhecidas do HIV. Por muito tempo, essa ideia pareceu distante. Mas um estudo publicado na Nature, uma das principais revistas científicas, reacendeu o otimismo em relação à chamada imunoprofilaxia, uma estratégia que busca prevenir e tratar a infecção usando anticorpos produzidos em laboratório.

Os pesquisadores analisaram o sangue de 32 pessoas conhecidas como “elite neutralizers”, indivíduos que, mesmo infectados, desenvolvem naturalmente anticorpos capazes de controlar o vírus de forma incomum. A equipe, liderada por Florian Klein, da Universidade de Colônia, na Alemanha, isolou e testou 831 anticorpos em busca daqueles com a combinação mais rara, com capacidade alta de neutralização.

Foi assim que chegaram ao 04_A06, um anticorpo com uma característica estrutural fora do comum. Ele possui uma inserção de 11 aminoácidos em sua cadeia, algo como um pequeno “braço extra” que lhe permite alcançar regiões muito conservadas da proteína gp120, peça-chave usada pelo HIV para invadir células humanas. Na prática, isso significa que o 04_A06 se liga a partes tão importantes do vírus que ele não consegue fazer as alterações necessárias para cumprir a missão de escapar da defesa do anticorpo.

Para ter ideia da dimensão, nos testes de laboratório, o anticorpo conseguiu neutralizar quase todas as variantes conhecidas do HIV-1: 98,5% de um total de 332 tipos diferentes do vírus. Ele também foi eficaz contra versões do HIV que já tinham mostrado resistência a outros anticorpos amplamente estudados, como o VRC01.

Já em experimentos com camundongos infectados, o anticorpo eliminou completamente o vírus, mantendo a carga viral indetectável por 12 semanas seguidas. Além disso, quando os pesquisadores compararam seu desempenho com vírus circulantes em estudos clínicos recentes de prevenção, os números continuaram altos. Simulações feitas em computador indicaram que, se usado em humanos, o anticorpo poderia impedir mais de 90% das infecções, algo que ainda não havia sido alcançado.

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O 04_A06 se destacou também por superar um dos principais entraves da chamada terapia com anticorpos neutralizantes amplos (ou bnAbs): a tendência de o HIV escapar das defesas após algumas semanas. O “braço extra” desse anticorpo parece justamente restringir essas rotas de fuga, tornando o vírus menos capaz de desenvolver resistência.

Embora os resultados sejam animadores, o estudo ainda está em fase pré-clínica. Até agora, os testes foram feitos apenas em laboratório e em animais, e ainda não se sabe se o 04_A06 terá o mesmo efeito em pessoas. Os próprios pesquisadores destacam que esses testes têm limitações e que o corpo humano pode reagir de maneira diferente do que foi observado nos animais.

As próximas etapas serão os estudos clínicos de fase I e II. A fase I costuma envolver um pequeno número de voluntários saudáveis e serve para testar segurança e tolerabilidade, observando possíveis efeitos adversos e definir doses seguras. Já a fase II amplia o grupo e começa a explorar a eficácia, verificando se o anticorpo realmente previne a infecção ou controla a carga viral.

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