O Banco Central (BC) encontrou uma forma inusitada para chamar a atenção à responsabilidade com as contas: um meme em alusão ao filme “Divertidamente 2”, que estreou na semana passada nos cinemas do país.
A imagem mostra a apresentação de uma nova emoção entre os personagens, chamada de “vontade de gastar sem poder”.
O meme foi postado na conta oficial do BC no Instagram na tarde desta terça-feira (25), com uma legenda reforçando a mensagem de controle com as finanças.
“Manter as emoções sob controle ao fazer compras é essencial para evitar gastos impulsivos. Antes de comprar, pergunte-se se realmente precisa do item. Estabeleça um orçamento e siga-o rigorosamente”, cita o texto.
“Planejar suas finanças permite identificar prioridades, economizar e evitar dívidas. Quer mais dicas sobre como tomar decisões financeiras mais seguras e eficazes?”, complementa, recomendando o acesso ao portal do BC sobre Cidadania Financeira.
A forma diferente de comunicação viralizou nas redes sociais, e houve quem associasse o recado aos recentes avisos do BC sobre a necessidade de o governo federal manter a responsabilidade fiscal.
“Tem que marcar o governo federal aqui, né?”, disse um dos usuários na publicação. “Indireta para o governo né. Quem pegou o código?”, afirmou outro.
Por outro lado, usuários também aproveitaram a deixa para criticar a decisão do BC em elevar o juro neutro do país para 4,75%, ante 4,5%, conforme ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), publicada nesta terça-feira.
“E aí? O que vcs tão fazendo pra aumentar o poder de compra??? Maior juro do mundo…cadê o juro neutro?”, questionou.
Ata de Copom reforça compromisso
A publicação do BC ocorre após a publicação da ata da última reunião do Copom, na quarta-feira (19), que manteve os juros em 10,5% ao ano.
A medida, tomada em unanimidade pelos nove membros do colegiado, representa o fim do atual ciclo de queda da Selic, iniciado em agosto do ano passado, quando a taxa estava em 13,75% ao ano.
Entre pontos citados pela autarquia para manter os juros inalterados na semana passada estava a questão fiscal, ponto reiterado nesta terça na ata da reunião.
“O Comitê monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros”, citou.
“O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”.
O BC ainda ressaltou que “políticas monetária e fiscal síncronas e contracíclicas contribuem para assegurar a estabilidade de preços e, sem prejuízo de seu objetivo fundamental, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”.
Especialistas defendem responsabilidade fiscal
O mercado financeiro piorou as expectativas para a economia brasileira com o aumento da desconfiança na capacidade de o governo controlar os gastos públicos e cumprir as metas de zerar o déficit fiscal a partir deste ano.
A mudança de percepção veio após sinalizações do governo de que o equilíbrio das contas se dará pelo aumento da receita, e não pelo corte de gastos.
O reflexo desse movimento foi a disparada do dólar para R$ 5,46 na semana passada, o maior patamar desde 2022, enquanto o Ibovespa está entre as bolsas globais que mais desvalorizaram no ano.
Em entrevista à CNN, Gustavo Franco, ex-presidente do BC e um dos “pais do Plano Real”, ressaltou que a falta de preocupação com a trajetória dos gastos públicos é o que explica o patamar mais alto da taxa de juros.
“[O governo] gasta hoje sem preocupação com as consequências de estar gastando o que talvez nem tenha. Sua dívida é muito grande, portanto, está “sacando” sobre o futuro. O juro alto reflete essa ansiedade”, disse.
O economista defende que haja uma dinâmica orçamentária para limitar as despesas. Em sua avaliação, o grande erro do governo é gastar sem ter recursos.
O gasto público hoje, com recursos que não existem, é uma aposta. É isso que faz os juros ficarem altos”, ressaltou.
Na mesma linha, Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) e da Julius Baer Brasil, disse que a responsabilidade é um risco, e que o governo não está construindo uma situação sustentável.
“São seguidos os anos de déficit. A gente não conseguiu construir, nem estamos no caminho de construção de uma situação sustentável”, disse Pessôa ao participar do programa WW desta segunda-feira (24).
“Esse problema é nosso, que a gente vai ter que resolver. Se não resolver, a gente perde o que a construiu, porque a inflação volta em algum momento”.